sexta-feira, julho 25, 2008

Figueira da Foz: pedida a perda de mandato do presidente

A perda de mandato do presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz (CMFF), António Duarte Silva, acaba de ser pedida ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra (TAFC), soube hoje o “Campeão”.
A acção, subscrita por mais de 20 pessoas, foi interposta com base na Lei nº. 27/96 (Tutela Administrativa das Autarquias) e na Lei de Acção Popular.

Segundo fonte do Tribunal, um juiz considerou desadequado o meio processual da acção popular, estando a decorrer o prazo para o advogado Pedro Trilho Y Blanco se pronunciar.
As acções administrativas especiais para perda de mandato dos autarcas, de carácter urgente, podem ser interpostas “por quem tenha interesse directo em demandar”.
“Há um claro encadeamento entre uma série de factos e actos administrativos, da inteira responsabilidade do presidente da CMFF” (autarca eleito pelo PSD com o estatuto de independente), alega Trilho Y Blanco.
Para a perda de mandato, o causídico invoca, nomeadamente, as alíneas c) e i) do artigo 9º. da Lei nº. 27/96. A alínea c) prevê a destituição caso haja violação culposa dos instrumentos de ordenamento do território ou de planeamento urbanístico e a alínea i) se, por acção ou omissão dolosas, os autarcas incorrerem em ilegalidade grave traduzida na consecução de fins alheios ao interesse público.

Como noticiámos a 26 de Junho de 2008, a autarquia suspendeu parcialmente para a zona do Vale do Galante o Plano Director Municipal (PDM) e o Plano de Urbanização (PU) quatro meses antes de ter sido outorgada a escritura que conferiu à empresa Fozbeach a posse do terreno onde está a ser edificado um aparthotel.
A suspensão foi objecto de deliberação em Fevereiro de 2003, por unanimidade, e a celebração da escritura ocorreu em Junho desse ano, sendo que o referido terreno foi vendido pela CMFF à firma Imofoz (Grupo Amorim) e esta revendeu-o à Fozbeach mediante lucro superior a um milhão de euros.
A decisão camarária (igualmente por unanimidade) no sentido de se proceder à elaboração de um plano de pormenor foi tomada a 15 de Abril de 2003 e, na véspera, um gabinete de arquitectura passou uma factura à empresa promotora do aparthotel.
Volvidos oito dias, a autarquia comunicou à Direcção Regional do Ambiente e do Ordenamento do Território (DRAOT) que lhe tinha enviado um exemplar do projecto prévio.

Trilho Y Blanco faz notar ninguém ter estranhado que um plano de pormenor cuja elaboração era suposto exigir, pelo menos, meio ano tenha sido objecto de projecto prévio volvida uma semana sobre a decisão camarária de meados de Abril de 2003.
“Dava jeito suspender o PDM e o PU e decretar medidas preventivas, com o falso pretexto inerente à construção de uma unidade hoteleira de referência”, tem vindo a declarar o advogado, que também é porta-voz do Movimento de Defesa do Desenvolvimento Sustentável do Vale do Galante (MDDSVG).
Segundo o jurista, “de uma suspensão do PDM e do PU, com o exclusivo escopo de construir um hotel de referência, acabou-se num plano de pormenor cuja componente dominante é a habitação”.

O presidente da CMFF, António Duarte Silva, tem justificado a construção de um volumoso aparthotel na cidade com a suposta falta de impacto significativo de um novo hotel de quatro pisos na oferta turística.
Menos ambicioso, o projecto inicial para uma unidade hoteleira deu lugar a um aparthotel, dotado de 600 apartamentos e 160 «suites», piscina, ginásio, sala de conferências, clube de saúde e zona comercial.
O conceito de aparthotel, que pressupõe a reserva de 70 por cento do espaço para locação, permite a venda de 30 por cento da superfície.
O edil diz, por outro lado, que a autarquia prescindiu dos direitos de preferência e de reversão sobre o terreno – quando ele, em meados de 2003, foi revendido pela empresa Imofoz à firma Fozbeach – por estar apostada em ver construída uma unidade hoteleira de, pelo menos, quatro estrelas.

Segundo um despacho do magistrado do Ministério Público João Garcia, proferido ao abrigo de outro processo, no contrato de urbanização, celebrado a 27 de Dezembro de 2006 entre a edilidade e a Fozbeach, “foram tidas em conta e expressamente integradas as condições da hasta pública” [aprovadas a 23 de Novembro de 2001].
Tudo começou com uma decisão camarária, em 2001 (tendo Pedro Santana Lopes o mandato suspenso), no sentido de vender, em hasta pública, uma parcela de terreno com 9.300 metros quadrados para construção de uma unidade hoteleira.
Para o MDDSVG, a suspensão parcial do PDM e do PU, embora feita sob “o pretexto” da construção de um hotel de qualidade, visou obter capacidade para edificação de prédios para habitação e comércio.
Na perspectiva do referido Movimento, o plano de pormenor foi “criado à medida da Fozbeach”, tendo permitido quadruplicar o número de pisos do aparthotel em relação aos da unidade hoteleira inicialmente prevista, além da duplicação da densidade de construção de fogos por hectare na área adjacente.

As condições da hasta pública, em que a Imofoz foi a única firma a licitar, compreendiam uma cláusula a determinar que a parcela de 9.300 metros quadrados era exclusivamente destinada à construção de um hotel.
Para Trilho Y Blanco, Duarte Silva alterou as condições da hasta pública e cometeu um ilícito do foro administrativo.
Ao outorgar a escritura naqueles termos, alega o advogado, o autarca alterou as condições de um concurso e possibilitou à Imofoz o não pagamento de sisa no montante de milhares de euros.
Na perspectiva do causídico, “tudo sugere que o gabinete projectista do «hotel de apartamentos» era o mesmo que elaborou o plano de pormenor com base em indicações de uma entidade privada”.
Segundo o MDDSVG, a edilidade acabou por vender à Fozbeach uma parcela de terreno confinante com a avenida do Brasil (com passeios públicos incluídos) cuja área ronda 4.000 metros quadrados.
Em síntese, assinala o MDDSVG, há hoje um empreendimento imobiliário privado a ser erguido em dois terrenos vendidos pela CMFF a particulares, “com a garantia para estes da viabilização de um plano de pormenor secreto e grotesco”.

Como o “Campeão” tem noticiado, por presumíveis indícios acerca da eventual autoria de crime em práticas urbanísticas, foram constituídos arguidos Duarte Silva e o ex-vice-presidente da CMFF Paulo Pereira Coelho.
Ambos os suspeitos desfrutam da presunção de inocência, cabendo ao Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Coimbra deduzir acusação ou proferir despacho de arquivamento do processo.

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